segunda-feira, 25 de março de 2013

Último cigarro: Ampulheta

Malas prontas no meio da noite.
Um aperto forte no peito.
Um derradeiro passeio pela casa.

[Uma camisa, roubada por impulso,
perfumava o ombro]

Chego até a porta, giro a chave, seguro a maçaneta,
mas não consigo...
Viro-me e encaro a sala, arfando.
Um carro passa e faz brilhar o cinzeiro na janela:
“Um último cigarro talvez me ajude”.


Walter,
Não posso mais. Minha coragem chegou ao fim. Este é o limite. Não posso mais. Não conseguimos e não vejo como vamos conseguir. Tínhamos um sonho, mas agora vou atrás dos meus. Te segura, te sustenta e persiste se quiseres.
Clara



Quem poderia dizer que um sonho não vale tanto?
Quem atiraria pedras contra minha vontade de ser feliz?

A liberdade, em sua inteireza,
inexiste.
[e esta verdade agora me é óbvia].
Que sentido faz,
então,
abrir mão do pouco que nos resta?
       

O táxi chegou buzinando e rompendo com violência
alguma coisa dentro de mim.
Pensei já ter chorado tudo, mas não...
Minhas pernas cederam e não havia nada em que se segurar.
Com o rosto contra o chão gelado
vi tudo por um novo ângulo
e a sala me contou em dois minutos toda a sua história,
demorando-se dolorosamente sobre as últimas semanas.


A brasa vermelha esmorece.
A casa fica escura e tudo silencia:
É hora de partir. 


Tuan R. Fernandes - Março de 2013

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